Platão e Sócrates costumavam
discutir nos mercados atenienses as virtudes de uma boa cidade e quais os
fatores que as faziam triunfar e quase sempre as qualidades inerentes ao fator humano
se sobrepunham aos fatores relativos à infraestrutura. Esta participação humana
mostra sua importância desde a própria criação das cidades e seguem pela
história, mostrando-se como resposta à maioria dos anseios de todos nós.
Hoje, quando pensamos em qual seria a cidade ideal para viver, uma ampla lista de cidades passa em nossos pensamentos e esta questão é periodicamente respondida por diversas instituições, que estabelecem seus parâmetros de avaliações, entre eles:
Hoje, quando pensamos em qual seria a cidade ideal para viver, uma ampla lista de cidades passa em nossos pensamentos e esta questão é periodicamente respondida por diversas instituições, que estabelecem seus parâmetros de avaliações, entre eles:
Revista Britânica Monocle: Saúde, educação, governo, áreas verdes,
transporte, cultura, lazer, poluição.
A classificação mais recente
originou-se da OECD (The Organisation for Economic Co-operation and Development),
que divulgou recentemente uma lista de cidades que são consideradas as melhores
para se viver e nos últimos dois anos, foi Camberra, capital politica da
Austrália, escolhida como a melhor.
Camberra que é uma cidade
totalmente planejada e construída para se contrapor à rivalidade entre Sidney e
Melbourne e se apresenta muito forte dentro dos parâmetros da avaliação, mas
que, segundo a Revista The Economist, dificilmente ela seria uma cidade que
muitos sonhem em viver, pois é muito planejada, com boas intenções, mas muito
artificial, sem alma e “sem barulho”.
Para eles, a melhor cidade também é australiana, mas uma concorrente de
Camberra. Trata-se da capital australiana da cultura: Melbourne. Já para a
Revista Monocle, a melhor cidade é Copenhague na Dinamarca.
Todas grandes cidades com suas
virtudes e com poucas deficiências, cada uma questionada por opositores,
principalmente Camberra, que o Jornal The Guardian questionou: Tornar-se-ão as
nossas cidades em mórbidas Camberras? Levando-nos a pensar o que faz de uma
cidade perfeita para vivermos? Onde nos sentiremos bem?
No Brasil, a Delta Economics& Finance/América Economia, realizou uma pesquisa com a finalidade de
buscar as melhores cidades do país para se viver e estabeleceu uma avaliação
aonde a pontuação máxima chega a 100 e os parâmetros são os seguintes:
Parâmetros de avaliação no Brasil |
Dentro desta avaliação, Fortaleza
ficou situada em 46º lugar (43,73 pontos em 100 possíveis), com muitas notas
baixas, especialmente em bem estar (2,73 - 5), em segurança (0,76 - 2), em
governança (16,75 - 27) e educação (4,99
- 10), entre outros.
Estes estudos buscam avaliar como
estamos em relação à qualidade de vida em nossas cidades e como a busca pelo
bem estar evolui, já que a expansão contínua costuma trazer sequelas perigosas
para os grandes centros urbanos: violência, problemas de mobilidade, lixo,
poluição atmosférica, poluição sonora, entre outros.
No âmbito deste texto, a Poluição
Sonora entra como o principal vilão de degradação da qualidade de vida e segundo os
estudos oriundos da Carta Acústica de Fortaleza, como nas cidades citadas,
mostram um perfil onde o trânsito se coloca com 85% de responsabilidade dos
ruídos produzidos na cidade, sendo assim a principal fonte de ruído.
Dentro deste espectro, recentemente,
o Jornal El País, mostrou que em Madrid, por exemplo, essa fonte (carros) contribui
com 80% do total e que recentemente um grupo de pesquisadores espanhóis tentou
quantificar estatisticamente, a dimensão do problema para a saúde,
principalmente em pessoas com mais de 65 anos. Este estudo, publicado na
revista Environmental Research, estima que o nível de ruído diurno associado a
1.048 mortes por doenças cardiovasculares e a 1.060 por doenças respiratórias. Em
cima de sua base de dados eles calcularam que se houver a redução média de um
decibel nos níveis de ruído durante o dia poderia reduzir o número de mortes em
468, sendo 284 mortes anuais de origem cardiovascular e 184 relacionadas com
problemas respiratórios.
Como já relatado anteriormente
neste BLOG, nos últimos anos, muitos estudos encontraram uma correlação entre a
exposição ao ruído e problemas cardiovasculares, como a hipertensão ou infarto
do miocárdio e paralelamente com problemas respiratórios. A tabela a seguir, foi
apresentada pela OMS em Sidney 2010.
Tabela resumo do impacto na saúde - OMS - ICA 2010 |
Ainda sobre o estudo publicado na
revista, os especialistas avaliam que por trás dessa conexão, entre outros
fatores, pode estar o cortisol, um hormônio que é liberado em resposta ao
estresse. O ruído aumenta o estresse e desencadeia a produção de cortisol, que
por sua vez ativa o metabolismo do tecido adiposo para aumentar a oferta de
energia, de forma que o corpo possa responder melhor ao estresse e assim, este
efeito acabaria agravando problemas como a arteriosclerose.
Além dos idosos, os estudos
também mediram variação nos níveis de cortisol na saliva de crianças que costumam
dormir em ambientes ruidosos e silenciosos e verificaram que o nível do
hormônio foi superior nas avaliações com ruído e a maior quantidade de cortisol
foi associada a uma resposta pouco satisfatória do sistema imunológico e esta
situação poderia estar por trás do agravamento de problemas respiratórios.
Assim, verificamos que a cada
ano, estes estudos e pesquisas vêm confirmando o impacto do ruído na saúde e na
queda da qualidade de vida nas cidades, principalmente nas maiores, já que
passou a ser um componente quase que inerente ao desenvolvimento e que muitas
pessoas se habituaram à sua presença constante e muitas vezes reclamam de sua
falta, vide observação do The Economist, em sua crítica à escolha da
“silenciosa” Camberra.
Para completar o já elevado grau
de ruído em nossas cidades, em muitas cidades do Brasil, a falta de “educação” eficiente
desde a fase inicial e o longo “desgoverno” da maioria destas cidades,
facilitaram o surgimento de fatores complementares para elevação deste nível de
ruído, como os paredões (pancadões), casas de show, restaurantes e igrejas sem
o adequado tratamento acústico e em sua maioria, localizadas em desacordo com a
legislação de uso e ocupação do solo.
É bem verdade que estas fontes
não incidem diretamente nos mapas de ruído, pois não são continuadas e diárias,
mas são objetos de estudos dos mesmos e colocados em confronto com o ruído
ambiente explicitado nos mapas, mostram seu impacto na população e refletem
diretamente na queda da qualidade de vida, como no exemplo a seguir onde um
paredão no bairro Vila Velha em Fortaleza (estudo detalhado em postagem posterior) mostra toda seu “poder” de incômodo e
de deterioração da qualidade de vida :
Mapa esquerdo: Noturno e sem paredão - Mapa direito: Noturno e com paredão (Origem: Carta Acústica de Fortaleza) |
Assim, percebemos que a busca
pela cidade perfeita não é tão simples e nos leva a refinar nossas exigências e
neste refinamento verificamos que algumas grandes cidades que não foram
citadas, apresentam trabalhos voltados para o bem estar da população e que
apresentam assim uma excelente assinatura ambiental.
Hoje temos inúmeras cidades que investem fortemente
na redução de seus níveis de ruído, eis alguns exemplos:
- · Oslo, na Noruega, apesar de ser grande produtora de petróleo, incentiva o uso de veículos elétricos (se 12% dos veículos forem elétricos, já se conseguiria reduzir meio decibel), apesar de que a intenção primordial na cidade é a poluição atmosférica.
Pontos de recarga de carros elétricos na Europa |
Estacionamento para carros elétricos |
- · Amsterdam, na Holanda, incentiva o uso de bicicletas e transportes públicos.
- · Almada, em Portugal, incentiva o uso de bicicletas, ônibus elétricos (flexbus), tipo de pavimentação e maior implementação de linhas de metro.
Flexbus em ruas estreitas de Almada (zero ruído de motor - zero de poluição atmosférica) |
Informações |
Metro de superfície na principal via da cidade, que foi reformada e
o espaço para veículos reduzido (Foto-arquivo pessoal). |
Cuidado especial com o ruído e a vibração (borrachas especiais ao lado do trilho) (Foto: arquivo pessoal) |
- · Madri, monitora o uso excessivo de veículos, incentiva mudança de pavimentação e uso de asfalto mais poroso, além de incentivo ao uso de pneus mais silenciosos (redução de até 9dB).
4 comentários:
Parabéns, boa postagem!
Parabéns#
Parabéns Aurélio, belo artigo, muito bem escrito, bastante informativo e ainda por cima trouxe dicas de cidades a visitar, principalmente Camberra, que não estava na minha lista. Vou ler a crítica do The Economist em relação a escolha de Camberra. Obrigado. Mairlon Moreira.
Olá Dr Aurélio
Boa noite
Parabéns!!!
Na verdade conheço bem algumas pessoas que jamais conseguiriam viver em cidades do interior porque já se acostumaram ao ruído das grandes cidades...Tinha um colega que dizia que as cidades interiorana estavam mortas sem vida, que precisava de fervilhar para se sentir vivo...
cada louco com sua mania...
Por isso é difícil cuidar da questão ambiental..
A existência de poluidores natos...
Conceição Dornelas
Postar um comentário